domingo, abril 24, 2011

Quem nunca idealizou o amor?



Era véspera de feriado e meu celular tocava desesperadamente. Olhei para o aparelho e o mesmo indicava número confidencial - se as pessoas soubessem que não atendo chamadas com o número oculto, elas não me ligariam, mas lembrei de uma amiga que sempre me liga com o identificador de chamadas desativado - Depois de três ligações, resolvi atender o celular e fiz bem, pois era a amiga que mencionei.
Com a voz chorosa me disse poucas palavras: - “Vou passar na sua casa. Preciso conversar... Brigamos”. E desligou. Logo pensei: - “Brigaram!” Quando você conhece bem uma pessoa as palavras são dispensáveis. O tom de voz e o silêncio dizem de um contexto que ainda não foi verbalizado. Minha amiga não precisava me dizer muito e ela sabia, afinal, nos conhecemos desde a adolescência.
Alguns minutos se passaram e lá estava ela. Ela entrou. Tomamos café e conversamos. Relatava-me de como era difícil a vida a dois... Dos impasses, da incompreensão, das palavras que não precisavam ser ditas... Enfim, contava-me de como era difícil estabelecer um diálogo quando tudo parecia só desencontro.
Escutei, falei pouquíssimo e a acolhi. Após o momento tenso - e sempre é, pois a dor que o amor provoca parece sangrar e o pior é que você não encontra a ferida para estancar a hemorragia - olhei para minha amiga e disse: - “Tenho pensado bastante sobre as dificuldades de encontrar um amor”... Fui interrompida por gargalhadas. Ela me conhecia bem e sabia que havia tecido alguma teoria mirabolante.
- Chegou a alguma conclusão? Perguntou minha amiga com uma expressão facial incrédula e crítica. Respondi que sim e continuei meu raciocínio: - “Lembra da época que tínhamos quatorze ou quinze anos e fazíamos uma lista com os predicados de um amor ideal? Minha lista continha jovem atencioso, romântico, charmoso...” Ela interrompeu dizendo: - “A minha lista tinha moreno, olhos claros, barriga de tanquinho...” - E mais risadas...
Entre beleza e personalidade, a lista de predicados só crescia. Pronto! Você entregava para o Anjo-Cupido um tipo de GPS que, em tese, o conduziria ao seu amor perfeito! Bastava procurar. Tarefa aparentemente simples, mas algo estava errado... Se, teoricamente, encontar o amor ideal era fácil, qual o motivo de tantos desencontros?
Dei um longo suspiro e com dedo apontado para o alto disse: - “LER”! – Às vezes penso, - “Danielle guarde suas ideias pra você”- mas rir com os amigos é impagável e, no final,  ganhar o sobrenome "Hellmann's" sempre vale a pena! E continuei a discursar: - “Acompanhe meu raciocínio: Quem aguentaria essa vida de índio? Só arco e flecha desde os primórdios! O resultado é Lesão por Esforço Repetitivo (LER), o que me leva a pensar em outra hipótese: falta de mão-de-obra qualificada entre os Anjos-Cupidos. Alguns cupidos afastados pelo INSS e cupidos inexperientes no serviço. Imagine a cena? A confusão?" - Nessa altura da conversa, já estava encenando o cupido, minha amiga se desmanchando em risadas e continuei: – "O cupido está mirando no seu amor ideal e acerta uma pessoa do outro lado da calçada. Cupido sem mira... Espalhando flechas imprecisas... Pode-se dizer que distribuiu flechas aleatoriamente. Esse é o motivo da confusão!" – Boa hipótese! Grita minha amiga como se estivesse dizendo “eureca!”
Ela balança a cabeça e diz concordar comigo, mas levanta outra hipótese: - “Ou, talvez, sejamos nós a bagunçar o trabalho do cupido. Afinal, sua lista muda de quanto em quanto tempo?”
Respondi dando risadas: – “A minha lista tem a estabilidade de uma montanha russa!”. Meu cupido deve ser um ingente! Refleti.
Apesar do contexto, foi uma tarde inesquecível! 
Minhas amizades são preciosas! Só na companhia dos amigos fico a vontade para partilhar ideias tão insanas. Também, que coerência há na paixão? Quem nunca idealizou um amor? E o cupido fica com a culpa... Pura injustiça!
Entre o real e o imaginário... Entre o coração partido e a ideia do cupido desastrado, passamos a tarde recordando dos tempos em que as feridas pareciam grandes demais. Já chorei por amor, pensando que aquele seria meu último pôr do sol. Intensa! Que último o quê? O sol nascia, o dia recomeçava e, sem perceber, a ferida cicatrizava. O que era imensurável ficava pequeno e, depois de um tempo, até virava motivo de risadas.
Colocar a culpa no cupido não diminuiu as lágrimas da minha amiga, como não diminuiriam as minhas se estivesse no lugar dela, mas lembrar das situações que já vivenciamos nos dá forças, porque sabemos que após o crepúsculo há a alvorada e com o nascer do sol, a esperança é concebida. Nada é permanente!

Danielle Faria.

terça-feira, abril 19, 2011

Que Complicação!


O mundo está ficando muito complicado! Talvez, não esteja complicado para todos. Aliás, tenho certeza que não há complicações para a maioria, mas eu faço parte da minoria.
Recentemente, meu aparelho de celular resolveu aposentar. Uma “vida curta” de trabalho... Menos de dois anos de labor! Logo imaginei: - "Daqui a pouco esses aparelhos vão solicitar o “BPC” – Benefício de Prestação Continuada. Parece piada!"
Fui até a loja comprar um novo celular. Uma moça gentil me atendeu. Mostrou-me vários modelos com tantas funções e nomes estranhos que nem consigo reproduzir a fala da atendente. Era um dialeto que eu desconhecia. Na tentativa de estabelecer uma comunicação, simplifiquei: - “Preciso de um celular que mande mensagem e que faça ligações”. Enquanto resumia as minhas necessidades de consumidora imaginava – “Não preciso de todas essas parafernálias que os aparelhos de celulares oferecem! Ficaria perdida... Até hoje não sei a função do bluetooth!”
Tenho que admitir. Estou bem abaixo na hierarquia alimentar da selva tecnológica... Estou sendo devorada!
Outro dia estava voltando de São Paulo e parei e em um restaurante. 
Usar o banheiro tornou-se complicado, começando pela porta de entrada. Quando você entra no banheiro, o habitual é você mesma abrir a porta. Coloquei a mão na fechadura e quase cai. A porta abriu automaticamente. Pensei: - “Que porta gentil! Alguns homens deveriam ter aulas de boas maneiras com essa porta...”. Após a entrada desastrosa, precisei usar a torneira para lavar as mãos. Que saudade da época em que você precisava girar na lateral ou no cume da torneira e a água saía! Contudo, nesse banheiro era diferente. As torneiras tinham um sensor de temperatura e movimento - até aqui tudo bem, já tinha sido apresentada a essas torneiras -  Mas imagine minha surpresa quando coloquei minhas mãos embaixo de uma delas e a água era azul. Mudei de torneira e água era vermelha. - "Uau! Aguá colorida! O que faltam inventar?" - Refletia com um ar de perplexidade. A água azul indicava temperatura de, aproximadamente, 25ºC e a água vermelha indicava temperatura superior a 30ºC.  Com todas essas novidades, meu apetite e meu tempo acompanharam as águas coloridas que desapareciam pelo encanamento.
Sinceramente, não consigo acompanhar tantas mudanças tecnológicas e muitas delas recebem o nome de “inteligentes”. Partindo dessa lógica de inteligência, só posso ser o oposto! 
Querem saber? Isso só complica! A ideia não seria simplificar? Mas como mencionei, imagino que sou a minoria nesse mundo tecnológico que me oferece mais que necessito.

Danielle Faria. 

Em tempo: não sou contra os avanços tecnólogicos... Só não consigo acompanhá-los, mas gosto da era digital. Caso contrário, nem teria esse blog e meios para divulgá-lo. 
As novidades não param de crescer e eu, sinceramente, tenho dificuldade de acompanhá-las. :-))
Abraços!

quinta-feira, abril 14, 2011

O Tamanho do Sonho


Era véspera de Natal do ano de 1989 e como de costume escrevia uma carta para o Papai Noel.
Meu irmão, meus primos e eu sentávamos em volta da extensa mesa da cozinha da vovó e, juntos, endereçávamos nossos pedidos ao "Bom Velhinho". Lacrávamos e entregávamos as cartas aos nossos pais.
Naquela época não era comum uma criança que acabara de completar cinco anos saber ler e escrever, mas eu aprendi. Era muito inquieta e curiosa para esperar a idade “correta” para ser alfabetizada – sete anos, naquele tempo.
Estava feliz, agitada, envaidecida, emocionada... Era um contentamento difícil de descrever, pois aquela era a PRIMEIRA CARTA... Elaborada com as MINHAS palavras.
Não era um texto longo, mas escrevi o suficiente para que o Papai Noel entendesse o meu pedido.
Na semana do natal, minha mãe acolheu-me no aconchego do seu colo e explicou que o Papai Noel não poderia me dar o presente que escolhi. Ela dizia que ele havia ficado imensamente triste por não me atender. Cuidadosamente, escolhia as palavras para justificar o porquê de o Papai Noel negar o pedido descrito em minha carta. Recordo que mamãe falava bem baixinho como se estivesse contando-me um segredo: - “É que na fábrica dele só se constroem brinquedos e pelo que me disse você quer uma de verdade. Ou a de brinquedo serve?” Balancei a cabeça indicando que não... A de brinquedo não serviria.
Lembro que fiquei chateada com o Papai Noel, afinal, tinha me comportado bem durante o ano.
Na mesma noite em que mamãe e eu conversamos, fui até quintal, deitei no banco de madeira para admirar o céu e quis desabafar diretamente com o “Bom Velhinho”: 
_ “Sei o porquê de não ganhar minhas asas" – pedi asas como as dos anjos _"O céu é muito grande e eu poderia me perder". - Era uma explicação sensata, mas quem disse que os desejos que o coração cultiva seguem a razão?
E continuei a discursar: _ "Queria tanto tocar as estrelas! Queria conhecer o arco-íris e, quem sabe, visitar Deus! Talvez, São Pedro não se importaria de abrir as portas do paraíso e eu poderia ver como minhas orações chegam até Jesus... Será que são levadas por anjos? Poderia perguntar a Jesus sobre a Trindade Santa... Afinal, porque o Espírito Santo é desenhado como se fosse uma pomba? Poderia também tocar as estrelas e visitar o Pequeno Príncipe." 
Haviam muitas perguntas. O céu sempre me fascinou... E, pelo que me lembro, fiquei um tempo considerável em silêncio pensando na minha conversa com o “Bom Velhinho”. Repassava cada palavra e imaginava como seria se tivesse asas. Até tentei argumentar: - “Reconsidere! Vou ser cuidadosa e voarei só em lugares próximos a minha casa!” - Obviamente tentei "barganhar"!
De manhã meus primos adolescentes, já sabiam da “menina que queria ter asas” e, é claro, fui a piada do dia.
Enquanto corria atrás dos meus primos munida de goiabas bem maduras e/ou podres que recolhi no chão do quintal, gritava os meus avós. Eu era veloz e esperta, mas, infelizmente, tinha uma mira desastrosa.
Como gostaria que meus primos ficassem impregnados com o cheiro das goiabas! Acertá-los não garantiria meu presente natalino, mas a piada teria o efeito inverso e seria eu a dar as risadas, mesmo sem as asas de anjo. Também, havia me comportado consideravelmente bem durante todo o ano e nada de asas? Uma goiaba a mais, outra a menos...
Sem mais goiabas, sem mais fôlego... Só ouvia as gargalhadas dos meus primos que ficavam cada vez mais insuportáveis.
Sentada no chão com os braços apoiados no joelho e com a cabeça debruçada sobre meus braços, chorava. Minhas lágrimas eram de desapontamento, raiva, vergonha, principalmente, vergonha!
Naquele instante, tive a consciência que nenhuma criança que conheci, havia feito tal pedido para o Papai Noel... - "Asas? Asas como as dos anjos? Impossível!" Pensava. E mais lágrimas.
Ouvi os passos da minha avó se aproximando – era inconfundível o ritmo do seu caminhar! - Ela olhou irritada para meus primos que se calaram. Segurou a minha mão e pediu para que eu ficasse de pé.
Com o olhar desapontado e com a voz engasgada perguntei a vovó: _“Sabia que não ganharei asas no dia de Natal? Papai Noel não fabrica esse tipo de presente". - Ela respondeu que sim... Que sabia. Em seguida, questionou: _“Qual é o tamanho do seu sonho, 'Pequena'?” Estiquei bem os braços na direção horizontal e disse que era maior que o próprio céu.
Ela sorriu e cochichou no meu ouvido: _“Se seus sonhos continuarem crescendo, suas asas também crescerão. Quando o sonho é grande e acreditamos que ele pode ser real, alcançamos o céu, se assim desejarmos.”- E como eu desejava!
Na noite de Natal tive a estranha sensação de ouvir o barulho de asas... Como o som de um pássaro levantando voo.

Talvez, aquele som fosse só a voz desinquieta do meu desejo...

Talvez, fosse a magia do Natal, sinalizando estar ali...
Ou, talvez, fosse um sonho bom. 

Independente "do talvez" e do seu conteúdo de possibilidades, pensei: _“Um dia terei minhas asas e voarei! É só cuidar dos meus sonhos...”

Semeio sonhos e colho "asas"...

Danielle Faria.